Exposição no MAMAM lembra ao público os 40 anos de
carreira do mestre das gravuras

Kéthuly Góes
Da equipe do DIÁRIO
O Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães (MAMAM) inaugura, nesta
quinta-feira, às 20h, uma mostra retrospectiva de fazer inveja a muitos
espaços culturais e museus espalhados pelo país.
Com uma coleção de 127 gravuras, já vista por mais de 70 mil pessoas no
Centro Cultural Banco do Brasil (RJ), em abril de 97, o museu comemora os
40 anos de dedicação à arte do pernambucano Gilvan Samico e permite que o
público mergulhe no universo fantástico e simbólico de quem fez do gesso, da
pedra, do metal, do linóleo e da madeira seus principais suportes artísticos.
Samico passou uma época pintando, fez desenhos, mas foi com o trabalho
desenvolvido com gravação, a partir da década de 50, que o Brasil e o mundo
o reconheceram como criador. Na exposição, há espaço garantido para o
primeiro trabalho, Pescadores – gravura feita a partir de uma placa de gesso -,
de 1953, e para todos os que se seguiram, até a obra do ano passado. Cena
Campestre (1957), a primeira xilogravura, também está entre as peças
selecionadaspelo curador Frederico Morais para a retrospectiva.
“Dividimos os trabalhos em três séries distintas”, adianta a responsável pela
montagem, Júlia Peregrino. “No térreo ficarão as gravuras em preto e branco,
do início da carreira e do período em que atuou entre o Rio de Janeiro e São
Paulo. No primeiro andar, as gravuras mais novas, coloridas. E no segundo,
uma série de 12 pinturas de Samico. Além deles, teremos a sala de vídeo,
onde exibiremos cenas da retrospectiva no Rio de Janeiro”. Para o público fica
a chance ainda de adquirir o catálogo com toda a obra do artista (R$ 40,00)
ou levar para casa uma camiseta (R$ 15,00) com a marca da exposição:
Samico – 40 Anos de Gravura.
Gilvan Samico é considerado um dos artistas mais importantes do país, entre
os que continuam produzindo. É fato que, desde que voltou a se instalar em
Olinda, diminuiu consideravelmente o ritmo de trabalho. Deu-se o luxo de criar
apenas uma gravura por ano. E a data de lançamento da obra é sempre
comemorada de forma especial.
Nocatálogo da exposição do MAMAM, Frederico Morais assina a
apresentação da mostra, lembrando vários momentos da vida do artista e
analisando a trajetória. Além de badalado crítico de arte – um dos mais
respeitados da América Latina -, Morais é autor de 29 livros sobre arte
brasileira. É dele o recém-lançado Arte É O Que Eu E Você Chamamos Arte
(Ed. Record). O escritor, dramaturgo e amigo de Samico, Ariano Suassuna,
também presta homenagem, assinando artigo sobre o universo artístico do
gravador no mesmo catálogo.
Reflexo da cultura popular
Lançado na cena plástica pernambucana pela Sociedade de Arte Moderna,
nos anos 40, Gilvan Samico já correu o país com desenhos, pinturas e
gravuras.
Ele morou em São Paulo e no Rio de Janeiro, trabalhou ao lado de outros
mestres gravadores, a exemplo de Lívio Abramo(SP), e Osvaldo Goeldi(RJ).
Nestes três anos, chegou a criar cerca de 56 gravuras.
Autodidata, começou a se dedicar à arte mais seriamente no Ateliê Coletivo
da Sociedade de Arte Moderna, anos 40 e 50, onde já gravava alguma coisa,
mas aproveitava bem mais as aulas de desenho com Abelardo da Hora. No
Ateliê, a preocupação com a função social da arte e com a realidade
contingente era a forma de lutar contra a arte acadêmica. A partir das
experiências no Rio de Janeiro e em São Paulo, Gilvan Samico viu a carreira
deslanchar. Segundo o crítico Frederico Morais, foi um período de
aprendizado e de tateamento linguístico.
Na volta a Pernambuco, em 1965, fixou-se em Olinda e voltou a trabalhar junto
a amigos artistas, como José Cláudio e GuitaCharifker. No Salão Nacional de
68, ganhou prêmio de viagem ao exterior e retardou os planos de não mais
deixar Pernambuco em pelo menos três anos. Entre as ciddes onde mororu,
passou mais tempo em Barcelona (Espanha), onde desenhava muito, fazia
alguns trabalhos sobre papael e pôde estudar a arte românica, a partir das
cenas bíblicas esculpidas nos muros do Parque Monjuic.
Convidado a participar de mostra paralela no XVI Salão Nacional de Artes
Plásticas, realizado em janeiro deste ano (RJ), o artista foi apontado pelos
organizadores como tradutor plástico do pensamento armorial. “Do trabalho
do gravador recifense derivam imagens nítidas, ricas em sugestões
simbólicas. Elas surpreendem pela aparente simplicidade, pelo modo como a
um só tempo fincam-se no chão agreste, para se elevarem e alimentarem
nossa sensibilidade”, descreveu a curadoria.
ARMORIAL
As gravuras dos folhetos de cordel, um dos marcos do Movimento Armorial na
década de 70, serviram de base para as artes plásticas, através de suportes
antes restritos ao artesanato, como talhas, tapeçarias e esculturas em
madeira e argila. E, nesse cenário, Gilvan Samico foi de fato o maior dos
expoentes, chegando a deixar rica herança (pinturas chapadas, irreais e,
normalmente, figurativas) às novas gerações de artistas pernambucanos.
O universo pictórico de Samico remete às figuras primitivas, à cultura popular
e especialmente ao imaginário do povo nordestino. No trabalho do mestre da
gravação, a tradição folclórica é mantida e a importância dos movimentos
culturais respeitada. Era novembro, ano passado, quando o público pôde
conferir a última criação do artista. Uma xilogravura exibida no Sobrado
Espaço Cultural, em Olinda, durante exposição que Samico dividiu com a
amiga aquarelista Guita Charifker.
Para saber mais
A realização da retrospectiva no Recife tem ainda outros motivos para
comemoração. No dia da abertura, o Centro Cultural Banco do Brasil e a
Fundação de Cultura Cidade do Recife assinam convênio de cooperação
cultural, o que deve garantir o vai-e-vem de exposições e eventos associados
à arte. O diretor do MAMAM, Marcos Lontra, revela que desde que havia visto
a mostra no Rio pretendia exibi-la no Recife. Só agora foi possível concretizar
o projeto.
“Nosso objetivo, enquanto museu, é trazer para cá grandes mostras, pôr o
público em contato com as grandes exposições, mas também valorizar e
revelar os grandes expoentes da arte pernambucana”, esclarece Lontra. “A
retrospectiva é uma forma também das pessoas se reconhecerem através da
arte. Samico consegue ser regional e universal ao mesmo tempo. Teve uma
inserção muito significativa no cenário modernista e é adorado no Rio de
Janeiro”.
SERVIÇO
Samico – 40 Anos de Gravura. Coleção de gravuras e pinturas,
retratando as várias fases da carreira do artista pernambucano
Onde:
Museu de Arte Moderna/ MAMAM (rua da Aurora, 265 – Boa Vista. Fone:
423.3007)
Quando:
Amanhã, a partir das 20h
Visitação:
Terça a domingo, 12h às 18h, até 30 de agosto