JORNAL PERNAMBUCANOS IMORTAIS

O escritor pernambucano Mário Sette dizia que, quando andamos pelo centro do Recife, estamos tão preocupados com os assaltos que deixamos de observar o valor dos monumentos, casarões antigos, portões de ferro trabalhados em Portugal, painéis de azulejos franceses e fachadas seculares que testemunharam a nossa história.

Na verdade, contribui muito com esta nossa “distração” o fato das belíssimas mansões de nobres famílias antigas serem usadas como lojas de artigos populares. O Atacadão da Papelaria, para não fugir à regra, escondeu a fachada do querido Cine Boa Vista, em sua filial da Rua Dom Bosco. E eu vou mais longe: A crise econômica, a violência que ela gera e a propaganda de consumo estão escondendo valores por tras de símbolos de status até então tradicionais. Se não, vejamos.

Há poucas décadas, conhecíamos o poder aquisitivo de alguém pelo automóvel que possuía. O proprietário de um carro importado de ultima geração seguramente pertencia à camada de poder aquisitivo mais elevado da população. Já o pobre possuidor de um modelo nacional superado, com cinco anos de uso, não conseguiria facilmente crédito para um empréstimo bancário.

Hoje em dia, os consultores de segurança pessoal da Policia Federal (e ladrões de banco capturados) asseguram que a melhor atitude de defesa contra assaltos ainda é “não ostentar riqueza”, vestir-se com simplicidade, não possuir automóveis muito chamativos (como vans e esportivos caros) e evitar residir em bairros supervalorizados ou casas suntuosas. Por isso, muitos ricos empresários estão adotando uma espécie de “disfarce social”: Conservam antigos automóveis de luxo como meio de transporte e moram em bairros de subúrbio ou residências de aparência simples, para evitarem chamar a atenção dos bandidos.

O dono de uma agência de propaganda de São Paulo, por exemplo, não troca por nada o seu Monza (no qual gastou recentemente quatro mil reais apenas para colocar um motor novo), com ar-condicionado, direção hidráulica, travas elétricas, vidros elétricos e um belo “amassão” na porta da mala traseira. Já o luxuoso interior da casa de um senador do Estado, num bairro da periferia de Olinda, é protegido apenas por um muro caindo aos pedaços lá fora.

Por outro lado, a facilidade das linhas de crédito e financiamento estão permitindo que pessoas de baixa renda tenham acesso cada vez mais a bens de consumo antes exclusivos dos mais ricos. Por isso são comuns famílias de poucos rendimentos usarem roupas caras, alugarem ou financiarem apartamentos de luxo, residirem em bairros nobres e possuírem carros de ultima geração (afinal, a mídia incentiva a vaidade de que é mais importante o “ter” do que o “ser”).

Por causa disso o proprietário de um famoso hotel de Pernambuco (que só anda de jeans e tênis surrado) escapou recentemente de um assalto, graças ao seu Fiat Uno usado: Enquanto conversava com uma funcionária subalterna (muito bem vestida, por sinal) no estacionamento do escritório, os ladrões preferiram colocar o revolver em cima “dela”, pra levar seu belo Sienna prata recém-adquirido.

O resultado é que não podemos mais garantir se o dono daquele carro do ano é um empresário bem sucedido ou o cara do Mille ao lado não tem aonde cair morto. E, muito menos, se o morador de uma cobertura em Boa Viagem está pagando o condomínio ou seu vizinho em Casa Amarela não é Antonio Ermírio de Morais.

Vou até colocar “película” no meu Chevette Junior, pra evitar seqüestros relâmpagos na Imbiribeira…

Gustavo Arruda