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Chegando ao ao seu comando, o General Bruno Delano observa que a bandeira que tremulava no mastro fora hasteada sem a sua presença. Entra de cara amarrada, mal prestando atenção na continência prestada bem rápida pelo sentinela de plantão. Passos apressados, fortes, fazendo ranger o assoalho do velho prédio, se dirige ao gabinete do primeiro andar, cruzando seus comandados sem responder aos cumprimentos. Aliás, ninguém lhe dirige nenhuma continência, o que contribui para aumentar ainda mais a sua irritação. Iam ver! Hoje é um daqueles dias que o General Bruno mais detestava: assistir a passagem de um comando com todas aquelas pompas, cerimônias, ordens do dia, toque de clarim, etc. Empurra a porta com o pé, assustando o seu ordenança que estava muito à vontade na sua cadeira de estimação, onde se via na parede um clarim que o General tocar, que era bom, não tocava. Mas tava lá, o clarim. Não era isso que contava para os amigos, rememorando o seu tempo de adolescência na rua do Cupim, orgulhoso de exibir o metalíssimo clarim… Toda vez que ele entrava no seu gabinete tinha que olhar para o clarim: era a primeira coisa que ele via, se bem que hoje, era o ordenança aboletado na sua cadeira. Que visão! Ia ver! Grunhindo alguma coisa que o tal ordenança entendera muito bem, o General Bruno Delano atola-se na sua cadeira, enquanto o Capitão PM Evilásio Gondim bota a cara na porta deixada aberta, lembrando que hoje tem passagem de comando! – Já sei! Porra! – Iam ver! Lembranças daquele tempo de criança que o General Bruno não gostava muito lá não. Feito aquele dia que foi se apresentar para o exame para o serviço militar e o sargento informou que estava rejeitado para o exército, depois de rir muito! Não adiantou dizer que estudara tudo que era código militar, manual, livros de estratégia, tática, que o sargento manteve-se irredutível. – Dessa vez, vê se engorda um pouquinho e ganha altura! – Sempre rindo!… O filho da puta! Ia ver… E assim o General começou a frequentar academias de ginástica, correr muito, aeróbica, natação, de madrugada e de noite, para se preparar para um segundo exame, dessa vez na marinha. Isso vinha à lembrança enquanto remexia na sua coleção de miniaturas de armas de guerra: uma réplica de um canhão holandês do século XVII. Na sua frente, uma edição atualizada de “Estratégia Militar” de Sir Basil Lidell Hart, ao lado da medalha de honra ao mérito da Cruz Vermelha. O seu primeiro comando foi à frente de uma brigada de garotos na rua do Cupim, portando uma espada de madeira e chapéu de jornal, distribuindo bordoadas na turma da Rua da Hora! Começa cedo a ser temido pelas ordens enérgicas e indiscutíveis. Na escola primária, era o único que tinha uma respeitável régua de madeira de 50 cm. Gostava de sonhar comandando a tropa, distribuindo ordens de serviço à torto e a direito, sem ideologia, o que, justiça se faça, não tinha, a não ser a ideologia do poder, como bem gostava de ler em “O Poder” de Bertrand Russel, outro livro seu de cabeceira. Essas lembranças sempre apareciam quando aconteciam solenidades feito essa, que, por força do cargo, teria que comparecer. Ainda mais que o Governador, sacana, o indicara como seu representante. É mandar ver e aguentar! – Iam ver! Acompanhado do adjunto, Capitão PM Evilásio Gondim, todo enfeitado com as dragonas douradas, medalhas bem distribuídas no peito, espadim brilhoso, seguiu em frente com sirenes abrindo caminho em direção ao comando do IV Exército. Todos os militares perfilados em frente do QG, chega com o seu colega de trabalho, o Capitão Evilásio, tomando este o rumo dos colegas de farda de outras armas, que também estavam à disposição dos vários órgãos estatais, enquanto General ia se juntar às autoridades civis. Todo mundo olhava para ele, enquanto um nó apertava a sua garganta, naquele momento. Não pela cerimônia da bandeira que já já iria começar ou pelo toque dos clarins anunciando o evento, mas de constrangimento, mesmo sendo Secretário de Segurança Pública do estado. Constrangido sim, pela maldita idéia de sua mãe, que sempre quis que seu filho fosse um grande militar e que fora o motivo de ser preterido no serviço militar, já que iria provocar muito vexame: ter lhe batizado GENERAL BRUNO DELANO!
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