Em 26 de julho de 1930, na Confeitaria Glória, no Recife, entra João Dantas, armado de um revólver, acompanhado do cunhado Moreira Caldas. Logo vislumbra João Pessoa. Aproximou-se dele:
– João Pessoa? Eu sou João Dantas.
Vários tiros foram disparados por João Dantas e por Moreira Caldas, não se tornando possível, assim, caracterizar qual tenha sido a bala fatal que lhe varou as costas. Ao tentar a fuga, João Dantas foi ainda atingido de raspão na cabeça com um disparo feito pelo motorista de João Pessoa.
Em seqüência, diversas outras mortes trágicas
Presos, João Dantas e Moreira Caldas foram recolhidos à Casa de Detenção, do Recife, onde ambos, no dia 3 de outubro, logo no início da Revolução de 30, viram-se degolados a cortes de navalha e suas cabeças remetidas à Paraíba.
Versão diferente dá conta de que eles se suicidaram com golpes do mesmo bisturi, primeiro Dantas, depois Caldas. Para sustentar a tese desse suicídio-a-dois, José Joffily a existência de bilhetes deixados por ambos sob os travesseiros: “Como poderiam estes documentos de despedida, escritos em instante derradeiro, apresentar a correta redação, o talho das letras e a autenticidade das assinaturas, comprovadas em perícia, se tudo fosse escrito no tumulto de uma feroz degola e trucidamento?” Cita a confidência de João Dantas ao seu irmão Manoel, como prova do seu intuito de suicidar-se: “- No caso de um movimento armado e vitorioso, eu não me entrego. Mato-me!” “- E tens ao menos com que te matar?” “Ele abriu a gola do pijama e retirou dele um afiado bisturi.”
Três dias depois aconteceu outra morte dolorosa: a da noiva Anayde Beiriz, uma moça de 25 anos, bonita, moderna e avançada para a época, que, já tendo ingerido o tóxico peçonhento de uma cobra, procurou refugiar-se no Asilo Bom Pastor, à Rua Benfica, bairro da Madalena, Recife, onde deu entrada às 11 horas do dia 6 de outubro para, mesmo socorrida pelas freiras, morrer três horas depois. Causa mortis, atestada pelo IML local: envenenamento.
Anayde, uma órfã de pai e mãe, execrada com o sinete daquela paixão por João Dantas, foi enterrada no cemitério de Santo Amaro, como mendiga, sem endereço e sem nome conhecidos, de acordo com sua certidão de óbito.
A quinta vítima dessa tragédia shakespeariana foi o ex-governador e já então Deputado Federal João Suassuna, assassinado, por Miguel Laves de Souza, com apenas um tiro, na esquina da Rua Riachuelo com a dos Inválidos, Rio.
João Duarte Dantas fazia violenta oposição a João Pessoa. Um apartamento seu, localizado em sobrado da então Rua Direita, 519 (hoje Duque de Caxias), bem no centro da capital, próximo do Ponto de Cem Réis e do palácio onde trabalhava João Pessoa, foi invadido pela polícia no dia 10 de julho, sem que se saiba até hoje se com ou sem o conhecimento prévio do presidente paraibano. Livros, documentos e móveis de João Dantas foram queimados na calçada fronteira.
Informa-se sem confirmação que se aprenderam cartas íntimas entre João Dantas e sua noiva Anayde Beiriz. O jornal A União, que já era então o órgão oficial do governo da Paraíba, publicou uma série de acusações gravíssimas a familiares de João Dantas, inclusive ao patriarca, Dr. Franklin. Ódio mortal passou a jogar um João contra o outro. Amigos preocupados com aquela rivalidade conseguiram que o Dantas se retirasse para Olinda, em Pernambuco.
O Presidente João Pessoa preparava-se para receber a homenagem de um grupo de paraibanos pelo famoso Nego, inscrito como símbolo na bandeira da Paraíba, quando anunciara a Washington Luís a sua definitiva recusa em apoiar Júlio Prestes. Precisamente no dia 26 de julho, e acompanhado apenas do seu motorista, foi ao Recife numa viagem particular, amplamente divulgada pelos jornais locais, a fim de visitar um amigo enfermo, o Juiz Francisco Tavares da Cunha Melo, internado no Hospital Centenário. O Estado de São Paulo publicou no dia 3 de outubro de 1930: “Tudo indica que João Pessoa fora ver uma cantora com quem vinha mantendo romance secreto e isto explica a sua ida à Joalheria Krause.”
(continua)
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