:::::::::::::: MEMORIAL PERNAMBUCO :::::::::::::: A História, a Cultura e a Arte de Pernambuco para o Mundo! ::::::::::::::

A Arte Correio surgiu numa época onde a comunicação apesar da multiplicidade dos meios, tornou-se mais difícil, enquanto que a arte oficial, cada vez mais, acha-se comprometida pela especulação do mercado capitalista, fugindo a toda a uma realidade para beneficiar uns poucos:burgueses, marchands, críticos e a maioria das galerias que exploram os artistas de maneira insaciável.

A Arte Correio (mail Art), Arte por Correspondência, Arte à Domicílio ou qualquer outra denominação que receba não é mais um “ismo” e sim a saída mais viável que existia para a arte nos últimos anos e as razões são simples: anti-burguesa, anti-comercial, anti-sistema, etc.

Esta arte encurtou as distâncias entre povos e países, proporcionando exposições e intercâmbios com grande facilidade, onde não há julgamentos nem premiações dos trabalhos, como nos velhos salões e nas caducas bienais. Na Arte Correio, a arte retoma suas principais funções: a informação, o protesto e a denúncia.

Os artistas teorizam sobre o movimento e surgem os espaços substituindo Galerias e Museus. Os envelopes / postais / telegramas / selos / faxes / cartas / etc. são trabalhados/executados com colagens, desenhos, idéias, textos, xerox, propostas, carimbos, música visual , poesia sonora, etc., e enviados ao receptor ou receptores, como é o caso do Postal Móvel e o Envelope de Circulação, , que depois de passar pelas mãos de diversas pessoas/países, retorna para o transmissor, tornando-se um trabalho Bumerangue. O correio é usado como veículo, como meio e como fim, fazendo parte/sendo a própria obra. Sua burocracia é quebrada e seu regulamento arcaico é questionado pelos artistas. Enviar uma escultura pelo correio, não é arte correio: “quando se envia uma escultura pelo correio, o criador limita-se a utilizar um meio de transporte determinado para transladar uma obra já elaborada. Ao contrário na nova linguagem artística que estamos analisando o fato de que a obra deve percorrer determinada distância, faz parte de sua estrutura, é a própria obra. A obra foi criada para ser enviada pelo correio e este fato condiciona a sua criação (dimensões, franquias, peso, natureza da mensagem, etc.)”, este trecho do artigo Arte Correio: uma nova forma de expressão dos artistas argentinos Horácio Zabala e Edgardo Antônio Vigo, define muito bem a utilização/veiculação do correio como arte.

A 1º Exposição Internacional de Arte Correio no Brasil, foi realizada no Recife, em 1975, organizada por Paulo Bruscky e Ypiranga Filho e, afora os problemas causados pela burocracia ultrapassada dos Correios, existe, quase que exclusivamente na América Latina, dificuldades com a censura, que fechou, minutos após a sua abertura, a II Exposição Internacional de Arte Correio, realizada no dia 27 de agosto de 1976, no hall do edifício sede dos Correios do Recife (Brasil) que patrocinou a mostra. Esta exposição, que contou com a participação de vinte e um países e três mil trabalhos, só chegou a ser vista por algumas dezenas de pessoas e, além da exposição, os artistas-correio brasileiros Paulo Bruscky e Daniel Santiago, organizadores do evento, e o artista Don Antonio, foram arrastados para a prisão, (incomunicáveis) da Polícia Federal, enquanto os trabalhos só foram liberados depois de um mês e, afora os danos, várias peças de artistas brasileiros e estrangeiros ficaram retidas e anexadas ao processo, até a presente data. O outro fato absurdo ocorrido dentro das “repressões culturais”, na Améria Latina, foi o aprisionamento, pelo governo uruguaio dos artistas – correio Clemente Padin e Jorge Carabalo, de 1977 até 1979. Em abril de 1981, o artista-correio Jesus Caldamez Escobar foi seqüestrado pela força militar ditatorial de El Salvador e só não foi assassinado porque consegui fugir e exilar-se no México. É sempre assim. Os que pretendem ser “donos da cultura” tentam impor sempre os seus “métodos”.

Torna-se difícil determinar a origem da arte correio. Em seu artigo Arte Correio: uma nova etapa no processo revolucionário da criação (1976), o artista-correio Vigo, cita Marcel Duchamp como um pioneiro de Arte Postal: “Nosso propósito é apresentar agora o que consideramos um primitivo da Arte Correio. São duas peças. A primeira se intitula CITA DO DOMINGO 6 de fevereiro de 1916, Museu de Arte de Filadélfia (USA), e consiste em textos escritos à máquina, pegados borda com borda, e a segunda PODEBAL DUCHAMP, telegrama datado de Nova York a 1º de junho de 1921, e que fora enviado por Marcel Duchamp ao seu cunhado Jean Crotti. Seu texto é intraduzível: PEAU DE BALLE ET BALAI DE CRINI e é a resposta ao Salão Dada/Exposição Internacional que se celebrava em Paris, na Galeria Montaigne, organizado por Tristan Tzara, prévia negativa de participar no mesmo e que fora comunicado por carta enviada com anterioridade ao referido telegrama. E uma vez mais devemos situar a figura de Marcel Duchamp em processos atuais. Esse gerador de ARTETUDO faz-se presente nas comunicações Marginais”.

Apesar dos trabalhos de Duchamp (CITA DO DOMINGO 6 de fevereiro de 1916 e PODEBAL DUCHAMP, 1º de junho de 1921), as experiências dos futuristas e dadaístas, os cartões postais dos radioamadores (QSL), do telegrama de Rauschemberg, Folon, das cartas desenhadas de Van Gogh para seu irmão Theo, os poemas postais de Vicente do Rego Monteiro, datados de 1956, de Apolinnaire com seus cartões postais com caligramas e de Mallarmé (que escreveu em envelopes os endereços dos destinatários em quadras poéticas que contavam com a boa vontade dos empregados dos Correios para decifrar seus enigmas poéticos), a Mail Arte surgiu na década de 60 (através do Grupo Fluxus e só veio a tomar impulso a partir de 1970). De acordo com as pesquisas realizadas, farei um pequeno histórico de alguns fatos importantes: a) Primeiros artistas a utilizarem a Arte Correio: 1960 – O Grupo Fluxus (USA), que propõe o intercâmbio de informações, publicações e colaborações ocasionalmente em eventos coletivos, foi o que pela primeira vez usou a veiculação do postal como elemento de comunicação criativa. Entre os componentes do grupo, destaca-se a atuação do artista Ken Friedman. Armand Fernandes (Arman): utiliza o meio de comunicação postal remetendo, como convite, a sua “La plwin” (Galeira Iris Clert), outubro de 1960, uma lata de sardinha. 1961 – Robert Filliou desde Paris envia seu “Estudo para realizar poemas e pouca velocidade” convites a subscrever para receber no futuro uma série de poemas, possibilitando também, a realização do tipo de poemas por ele anunciados. 1962 – Ray Johnson inaugura em New York, a Escola de Arte por Correspondência de New York, e no ano seguinte produz um clássico de tendência, escrevendo no envelope uma carta, tanto no verso como reverso. Quebra assim o conceito de privado e produz o estado público das suas aparentes intimidades em diálogo com um terceiro que até esse momento era de caráter privado.

1965 – Mieko Shiomi realiza uma proposta postal que deve ser respondida e devolvida pelo receptor: com estas respostas, dará forma a sua obra. “Poema Espacial n.º 1”. 0 texto da sua proposta é o seguinte:

UMA SÉRIE DE POEMAS ESPACIAIS: N.º 1 · Escreva uma palavra (ou palavras) no cartão que segue junto com esta, e deixe-a em algum lugar. Faz-me saber qual é a palavra e o lugar para que eu possa fazer um plano com sua distribuição sobre um mapa do mundo, o qual será enviado a cada participante. Mieko Shiomi 1967 – O poeta espanhol Joan Brossa realiza o seu poema-objeto “Luva-Carta”. b) Devido a grande quantidade de exposições de Arte Correio realizadas atualmente em todo o mundo, citarei apenas as mais antigas e algumas mais recentes: “N.Y.C.S. Show” organizada por Ray Johnson, USA/1970; “Bienal of Paris”, organizada por J. M. Poinsot, França/1971; “Image Bank Postcard Show” Canadá/1977. “O One Man Show”, organizada por Ken Friedman, USA/1973; “International Cyclopedia of Plans and ocurrences”, organizada por David Det Hompson, USA/1973; “Artists Stamp and Stam Images”, organizada por Hervé Fischer, Suíça/1974; “Festival de La Postal Creativa”, organizada por Clemente Padim, Uruguai/1974; “Inc Art”, organizada por Terry Ried & Nicholas Spill, Nova Zelândia/1974; “I St New York, City Postcards Show” organizada por Fletcher Copp, USA/1975-1976; “Last International Exposition of Mail Art”, organizada por E. A. Vigo & Horácio Zabala; “1º Exposição Internacional de Arte Postal”, organizada por Paulo Bruscky e Ypiranga Filho, Brasil/1975; “International Rubber Stamps Exhibition”, organizada por Mike Nulty, Inglaterra/1977; “Mail Art Exhibition International”, organizada pelo Studio Levi, Espanha/1977; “Gray Matter, Mail Art Show”, organizada por S. Hitchocock, USA/1978; etc. c) A partir de 1972, vários artigos começam a ser publicados, destacando-se entre eles: Albright, Thomas, “Correspondence: New Art School”Roling Stones Magazine, USA/1972; Alloway, Lawrence, “Send Letters, Postcard, Drawings, and objects…” Art / Jornal1977; Bowles; Jerry G., “Out of the Gelerry, into teh Mailbox”, Art in America, USA/1972; Zack David, “Na Authentik and Histotokal Discourse on the Phenomenon of Mail Arte, Art in America, USA/1973, “Arte Correio: uma nova etapa no processo revolucionário da criação”, de e Edgardo Antônio Vigo, Argentina/1976. d) Várias publicações de Arte Correio surgem: OVUM, Ephemera, Runing Dog Press, Stamp in Praxis, Vile, Intermedia, Cisoria Arte, Cabaret Voltaire, OR, Geiger, Orgon, Super Vison, Telegramarte, Doc (k)s, Multipostais, Arte Classificada , Tabu, Totem, Heut Kunst, Soft Art Press, Buzon de Arte, Front, entre várias outras que são publicadas em diversos países. Além do livro “Mail Art: Comunicação a Distância/Conceito” do francês Jean-Marc Poisot (1971), O artista norte-americano Mike Crane, publicou o livro “Correspondence Art”.

Na Arte Correspondência, o Museu cede lugar aos arquivos (Parachutes Center for Cultural Affairs/Canadá, Small Press Archive/Bélgica, Bruscky Arquivo/Brasil, etc.) e as Caixas Postais. Boletins Informativos sobre eventos e publicações em geral são editados e remetidos aos artistas de todo o mundo, como é o caso do INFO Editado por Klaus Groh do international Artist Cooperation/Alemanha e do informativo do Centro de Arte Brasileira de Informação e união (CAMBIU), editado por Paulo Bruscky, Daniel Santiago, Silvio Hansen, J. Medeiros, Unhandeijara Lisboa, Marconi Notaro e outros artistas. Além dos boletins, existem as “correntes”, nas quais você faz novos contatos, remetendo um trabalho de Arte Postal para o 1º nome da lista que é automaticamente excluído, sendo 0 2º passado para o 1º, o 3º para o 2º, etc. e inclui seu nome em último lugar, tira cópias geralmente em número de dez e envia a outros artistas, quando seu nome chega em 1º lugar, você começa a receber trabalhos de vários artistas de diversos países que você nunca havia contatado. Existem ainda os slogans criados pelos artistas, como é o caso do artista correio alemão Robert Refheldt: “Arte é contato, é a vida na arte”. “Assim se Fax Arte” e “Arte em todos os sentidos” de Paulo Bruscky.

O número de artistas correio aumenta dia a dia: o subterrâneo estourou, tornando a arte simples. É lamentável que alguns artistas quebrem esta corrente, deixando de responder alguns trabalhos recebidos.

A ARTE CORREIO é como história da história não escrita. HOJE, A ARTE É ESTE COMUNICADO. Este texto foi escrito em 1976, retrabalhado em 1981, e já foi publicado no Brasil, Polônia, Estados Unidos, Alemanha e Itália.