Seu comandante foi o aviador Ribeiro de Barros que aos 26 anos de idade, idealizou, organizou, financiou, comandou e executou o vitorioso vôo, tendo como tripulantes o navegador brigadeiro Newton Braga, o co-piloto Arthur Cunha, substituído por João Negrão, e Vasco Cinquini, mecânico.
No momento mais dramático e perigoso do vôo, há 2.400 Km do Brasil – quando o JAHÚ pousou junto a Ilha São Tiago (em Porto Praia), arquipélago de Cabo Verde, para abastecimento e reparos – o piloto auxiliar Arthur Cunha, zarpando para a Europa, procurou a imprensa para desmoralizar Ribeiro de Barros aquele que o havia contratado até o término do percurso.
As declarações impulsivas ou distorcidas pela imprensa, de Arthur Cunha tiveram grande repercussão internacional, criando até um problema diplomático, entre a Espanha e o Brasil. Após descobrir água, sabão caseiro e areia nos depósitos de combustível, o comandante Ribeiro de Barros resolveu desmontar os motores do hidroavião, encontrando também um pedaço de bronze no fundo da cárter do propulsor, colocado ali com o propósito de danificar o conjunto mecânico e provocar a interrupção do vôo.
Todos esses fatos tornaram-se públicos e o governo brasileiro envia um telegrama ao comandante do JAHÚ, em Porto Praia, ordenando-lhe que interrompesse o reide, encaixotasse o aparelho e retornasse ao Brasil.
Indignado pelo teor do texto, responde prontamente pela mesma via:
Exmo. Sr. Presidente. Cuide das obrigações de seu cargo e não se meta em assuntos dos quais Vossa Excelência nada entende e para os quais não foi chamado. Ass. Comandante Barros. Num gesto admirável de renúncia, sua mãe, Margarida Ribeiro de Barros, compreendendo a angústia do filho e a ansiedade da alma brasileira, envia-lhe do Brasil um telegrama que passaria a fazer parte da História do JAHÚ: “… Aplaudimos tua atitude. Não desmontes o aparelho… Paralisação de reide será fracasso. Asas avião representam Bandeira Brasileira… Bênçãos de tua mãe, Margarida.”
Osório Ribeiro, irmão do aviador, contrata no Brasil um novo co-piloto, João Negrão, e segue com ele para Cabo Verde. Ao deparar com o comandante do JAHÚ, magro, pálido e debilitado pela quarta crise consecutiva de malária, tamanhas adversidades e provações do irmão, não contém as lágrimas.
Dia 28 de abril de 1927 – Quatro e meia da madrugada. A população da Ilha de São Tiago (Cabo Verde), acorda sobressaltada com o rugido ensurdecedor de 1.100 HPs (550 em cada motor) de potência a plena rotação, cuspindo fogo pelas 24 trompas de escape e tal qual um monstro enfurecido vai rasgando uma a uma as ondas para depois apoiar-se nas asas e alçar vôo. O JAHÚ contorna repetidas vezes a ilha, para ganhar altura, enquanto as luzes do povoado se acendem lá embaixo e vão ficando para trás…
Trazendo o manche em direção ao peito, Ribeiro de Barros grita aos companheiros: “apaguem todas as luzes de bordo. Eu quero ver o Cruzeiro do Sul, mesmo que seja pela última vez.”
Tempestade… ventos fortes sacodem o JAHÚ. A água gelada arremessada pelas hélices penetram a carlinga aberta, escorre em abundância pela blusa de couro, encharcando o macacão e botas do comandante Barros e se deposita no assoalho da cabina de comando. Um forte estampido, seguido de um abalo na aeronave, põe em alerta a tripulação. O JAHÚ que demonstrara tanto vigor até aquele instante, começa a acusar sinais de cansaço. A hélice traseira sofrera uma avaria. Barros pede calma aos companheiros, enquanto reduz para 500 RPM o motor traseiro vagarosamente, testando a resposta do avião. Ato contínuo arremete para 1.500… 1.600… 1.700 as rotações do motor dianteiro. O avião encontra-se no limite da sustentação aerodinâmica, mas, o altímetro continua estável: 250 m de altura. A altitude média dessa histórica viagem foi de 300 metros, numa velocidade de 190 K/h – recorde absoluto por dez anos consecutivos. O navegador que estava debruçado sobre a carta geográfica, mal podendo manipular régua e compasso, levanta o braço direito com o punho cerrado, esmurrando o espaço – num gesto ritual de vitória – e grita: atravessamos o Equador… Em seguida passa ao Barros, através do Negrão, um bilhete com as letras trêmulas – LAT 2 º. S. Barros esboça um sorriso e anota no verso: “450 litros” e devolve ao Braga. O JAHÚ faz um pouso triunfal em águas brasileiras, na enseada Norte da ilha de Fernando de Noronha. Nos tanques, restavam ainda 250 litros de combustível, como atestou o comandante Nisbet, no navio Ângelo Toso, de bandeira italiana, que presenciou à distância a amerissagem. Foi a conquista da raça brasileira nos domínios do espaço, sendo esse feito reconhecido mundialmente na época e o aviador brasileiro recebeu condecorações, honrarias, diplomas e prêmios de inúmeros governos estrangeiros. Dez anos depois do vitorioso vôo do JAHÚ, a Liga Internacional dos Aviadores (LIA), sediada em Paris, França, concede ao comandante Barros a mais importante de suas condecorações, o troféu Harmon, como prova de reconhecimento, ao mesmo tempo em que o nomeia para o cargo de vice-presidente da LIA. No Brasil, as homenagens e manifestações de júbilo aos tripulantes do JAHÚ arrastaram-se por meses seguidos, conforme documentam as publicações da época.
Em 1930 João Ribeiro de Barros adquire na França um avião Breguet e o batiza com o nome de sua mãe, Margarida – falecida no ano anterior – com o fim de realizar um vôo do Rio de Janeiro a Paris. Quando se dirige ao Campo dos Affonsos, para iniciar a viagem, proíbem-lhe o acesso ao aparelho. Seu avião é confiscado por ordem do governo, para ser usado contra as forças paulistas na revolução que acabara de eclodir.
Encontra-se Ribeiro de Barros em sua fazenda, quando é surpreendido pela presença do delegado Amazo Neto acompanhado por oito investigadores. Dão-lhe voz de prisão, sob a alegação de estar ele, Ribeiro de Barros, publicando um jornal clandestino contra a ditadura Vargas.
Vasculham sua casa em Jaú e transportam-no, escoltado, para São Paulo, onde dão busca em seu apartamento. Nada constando contra ele, dão-lhe de novo a liberdade.
Volta o aviador jauense para sua fazenda Irissanga, onde nasceu em 4 de abril de 1900, profundamente abalado, remoendo com resignação e silêncio as adversidades e as mazelas humanas. Morreu nos braços de seu irmão Osório, em 20 de julho de 1947. Fonte: História Heróica da Aviação (José Ribeiro de Barros), Asas ao Vento (Newton Braga), João Ribeiro de Barros (José Raphael Toscano), A Epopéia do “JAHÚ” (Deputado Hilário Freire), Asas Brasileiras (Gerson Mendonça), Jornais e Revistas (Da época – anos 20, Séc. XX), A. Charles Rodrigues – charles@promotur.com, José Raphael Toscano (15/05/97), Alex Pinheiro Machado Rodrigues – alex@bsbnet.com